quinta-feira, março 31, 2005

Impossibilidade da Paz externa e da Harmonia interna?

A respeito da tradução da "Ilíada", Frederico Lourenço (entrevista ao DN), aborda a chamada tragédia da condição humana: “paz como uma impossibilidade”. Caros pacifistas: não se trata de uma prescrição normativa, mas de uma corajosa constatação.

Em relação à Paz (política externa) - Apesar de tudo, não devemos desistir de Kant (atenção: Kant não era um pacifista nem um defensor do suposto direito internacional. Como liberal clássico que era, Kant defendia a possibilidade das Repúblicas, regidas pelo constitucionalismo liberal, usarem a força contra regimes não-constitucionais. Para que conste…)

Quando à Harmonia (política interna) - O conflito entre grupos humanos é inevitável? A Harmonia é impossível? Exacto. Explicamos melhor. Existem sistemas políticos que procuram a perfeição intelectual, isto é, têm como objectivo alcançar a Harmonia celestial na terra. Estes sistemas têm uma consequência: fecham o futuro da sociedade; todos os homens estão obrigados a trabalhar para esse futuro.
Um sistema com estas características não é... um sistema político para os "homens". É, na verdade, uma aspiração teleológica que procura eliminar o conflito humano, em nome de um ideal de HOMEM. Ora, a eliminação de qualquer conflito significa inevitavelmente a eliminação das diversas liberdades em questão. Não esquecer: um conflito é um sintoma. De quê? De liberdade, claro. Há conflito porque há liberdade para escolher. É isto que Rousseau e seguidores nunca compreenderam.

A tragédia da condição humana é esta: a liberdade e o pluralismo dos “homens” têm um preço: o conflito. A harmonia em torno do ideal de “HOMEM” tem outro preço: a tirania. Prefiro o primeiro. Fico com umas cicatrizes no lado direito, mas ninguém me obriga a fazer o que não quero.

Quem acredita na Liberdade tem a obrigação de criar sistemas que efectuem uma gestão dos conflitos entre grupos humanos. A história do liberalismo clássico resume-se a isso. Dada a impossibilidade do consenso sobre os fins, importa criar um consenso em relação aos meios: democracia representativa gerida pelo constitucionalismo liberal.

E quem acredita na Harmonia? Nunca se preocuparam em lidar com o problema da Tirania. Aliás, negam a existência da Tirania quando esta advém de projectos em prol da unidade. À esquerda, os comunistas ainda consideram Lenine como uma espécie de herói que a História, afinal, não compreendeu. À direita, o nacionalismo agressivo da “Nação” continua a navegar nalgumas cabeças que não aprendem nada com a História.

1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Simples e directo. Como um bom vinho do Porto estás a envelhecer bem na garrafa.

10:48 da manhã  

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