terça-feira, outubro 25, 2005

O aluno aplicado

A direcção de campanha de Mário Soares foi profundamente incapaz de compreender o momento político e público nacional que privilegia uma institucionalização do rigor em figuras de poder com uma visão clara para o futuro.
A maioria absoluta de José Sócrates não lhe devia ter deixado dúvidas nesse ponto. Mas a apresentação pública da candidatura presidencial de Soares foi um discorrer de déjà vu deprimente, de reunião da arcaica Esquerda socialista, bloquista e sindicalista com figuras de um esquecido passado nacional.
Nos anos 80 ou 90 esta fórmula de candidatura colectiva apoiada na afabilidade pública de Soares poderia surtir efeito, mas hoje ela está definitivamente ultrapassada.
A agenda soarista poderá falar de “personalização do poder”, de “paternalismo” ou de “presidencialização do regime” com Cavaco Silva mas a realidade eleitoral sofreu sérias mutações. Três décadas depois de Abril e em hora de necessidade uma dicotomia Esquerda/Direita como agenda eleitoral terá pouco efeito e a escolha será feita com base no rigor institucional do candidato, sem margem para grandes cargas ideológicas
Mário Soares foi suficientemente inteligente para não se deixar filmar enquanto Cavaco Silva apresentava a sua candidatura. A verdade é que, como qualquer aluno aplicado, também ele rabiscou apontamentos da lição de quinta-feira.
Hoje, Soares apresentará o seu manifesto eleitoral numa sala vazia de caras das décadas de 80 e 90, mas não escapará a nova sensação de déjà vu, desta vez face à apresentação da candidatura de Cavaco Silva.
A realidade de que Soares não conseguirá esconder é que a sua candidatura presidencial tem como única motivação uma reacção face Cavaco Silva, cujo passo tenta desesperadamente acompanhar.